domingo, 18 de novembro de 2012

Como?

Como iremos além da encruzilhada onde os meus olhos, nos teus, se quebraram?
Como sairei dos teus braços, meu amor, quando o que me dás me parece sempre mais? Como largarei a tua mão, cruzada na minha sobre o mesmo cobertor castanho-claro; Como te proibirei de embarcar da minha vida, por medo a ti, amor? Como? Como é que este medo a ti, e a tudo o que implicas, a tudo o que és por de trás dessa parede que é a minha  expectativa, poderá alguma vez ser maior que nós?
Se todo o meu ser ao vento abandono, e sem medo nem nó me destruo em ti; se morremos em tudo o que sentimos, mas essa morte pode ser cantada... É porque estamos nus de alma, embalando a nossa própria dor.
É a esta hora que o frio se abate sobre mim e me faz pensar que a brisa dançante que brinca nos meus cortinados me poderia gelar o coração um pouco mais, me gelar os sentimentos um pouco mais, quando te vejo sair pela minha porta de forma altiva e imparcial. Assim seria, se o tempo para mim não congelasse ele, no momento em que a minha imaginação te toca a sair pela minha porta. E não. Altiva e imparcialmente renego esta hipótese. 
Isto porque... nos teus olhos julgo ver-me na promessa de todos os seres que poderia ter sido, se a vida tivesse sido outra. Isto porque, nos teus olhos toco o medo de me sentir sem forma, vaga e incerta. Isto porque, nos teus olhos quebro todos os meus limites, e tudo se torna, fatalmente, infinito.

Como irei eu além da encruzilhada em que os meus olhos, nos teus, se quebraram?
Eu espero sempre por ti. 
És o espírito que narra cada linha. És a vela que bebe o vento do meu espaço. És o gesto luminoso de dois braços abertos sem conhecer limite.
Em mim, a medida suprema, o canto compassado erguido puro, perfeito e harmonioso no coração dos ritmos secretos. És tu. Tudo. E nada. No vazio de tudo o que transborda, és tu.

"A Terra é, fatalmente, um fantasma
Ela que toda a morte em si embala
(...)
Sei que canto à beira do silêncio
Sei que bailo em redor da minha suspensão"
(Sophia de Mello Breyner)